Outro lhe disse:
Seguir-te-ei, Senhor; mas deixa-me primeiro despedir-me dos de casa.
Mas Jesus lhe replicou: Ninguém que, tendo posto a mão no arado,
olha para trás, é apto para o reino de Deus. Lucas 9:61-62.
O Perigo do
Passado
A experiência tem
história, mas não podemos viver voltados para o passado. Nenhuma
pessoa lúcida nega a importância da experiência na história. Sem
os fundamentos do passado não temos a competência para construir
com sabedoria o futuro. Os alicerces do amanhã estão baseados no
ontem. Precisamos do conhecimento antigo para elaborar o novo, pois
as raízes da antiguidade servem para sustentar o desenvolvimento
vindouro. O retrovisor é fundamental para o desempenho no tráfego.
Muitos desastres são resultados da falta da visão anterior. Porém,
a vida não pode andar para trás.
No caso em foco, Jesus
censura uma pessoa que estava presa ao cordão emocional de sua
linhagem. Ele queria seguir a Jesus, mas tinha um vínculo com a
família que precisava de acertos. Na vereda da fé cristã há
muitos que pensam deste modo. As tradições culturais e o peso da
opinião doméstica exercem grande pressão na decisão pessoal.
Muitos ficam amarrados ao julgamento do seu clã e sentem
dificuldades para tomar posição. São pessoas carentes que temem
perder o apoio emocional da família e buscam conciliar sua fé com a
aprovação dos mais chegados.
Porém, esta abordagem
ganha uma estimativa muito mais ampla, quando examinamos outros lados
da questão. O olhar para trás pode representar toda tentativa de
congelamento da experiência. Um grande risco que vemos na história
da igreja é o fascínio com o passado. Temos uma tendência de
perpetuar os métodos de uma época. Aquilo que foi de grande valor
num momento histórico recebe dimensões permanentes e, com isto, a
igreja se inclina para colecionar peças de museu.
Volto a insistir: não
é possível caminhar com saúde relacional, sem memória. O passado
tem importância fundamental no progresso de qualquer sistema, e há
elementos no projeto da igreja que são imutáveis. Faltando no
horizonte do tempo a dimensão do passado, fica muito difícil
construir uma visão adequada do futuro. Contudo, não é normal
permanecer com aquilo que ficou obsoleto. A lamparina ainda tem a sua
noite de glória nos lugares onde não há energia elétrica, mas
nenhum citadino defende a sua permanência no mundo de hoje. Andar de
charrete pode ser pitoresco, mas é atraso no mundo automotivo.
Antes de qualquer coisa
precisamos fazer uma distinção entre aquilo que é estável e as
coisas que são transitórias. Sabemos que a Palavra de Deus é
eterna e que os seus ensinamentos são duráveis. A ética da Bíblia
não muda. As leis do decálogo continuam vivas sob o comando da
graça. Ninguém pode considerar superados os princípios da moral
bíblica, uma vez que estão alicerçados na base perene do caráter
de Deus. Mas os costumes e os métodos históricos precisam ser
avaliados em cada geração. Não devemos mumificar aquilo que é
provisório. A permanência das coisas interinas representa um
desperdício de tempo e um gasto tremendo de energia.
A mulher de Ló
tornou-se uma estátua de sal ao virar-se para trás. A igreja
nostálgica perde sua função de sal da terra, quando se agarra a
uma metodologia retrógrada. A esterilidade de ambas se manifesta com
a contemplação do passado em desuso. Fixar os olhos naquilo que
pôde ser relevante noutra época, mas se tornou banal para este
tempo, se constitui na maior improdutividade na vivência
comunitária. As pessoas orientadas de forma dogmática para os
conceitos atrasados, tentando soluções antiquadas para problemas
novos, acabam se tornando desqualificadas para o seu momento
histórico. Por isso, é importante a distinção entre os fatos
eternos e as coisas efêmeras, a fim de não descartar o que é
imutável e não perpetuar aquilo que é temporário.
O apóstolo Paulo foi
um homem de vanguarda que sabia discernir entre os eventos
importantes e necessários e aqueles que serviam momentaneamente para
algum propósito. Os lances que foram admiráveis para ele numa
época, deixaram de merecer sua apreciação, quando auferiu os
melhores conceitos da graça de Deus. Irmãos, quanto a mim,
não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me
das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de
mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação
de Deus em Cristo Jesus. Filipenses 3:13-14. Paulo não ficou
paralisado em sua experiência passada, uma vez que sua meta tinha
proporções absolutas.
Não podemos perder de
vista o alvo. A fé cristã tem mira. A falta de um objetivo supremo
desencadeia o envolvimento com as coisas periféricas. Precisamos
atirar na mosca. Quando a igreja desloca seu olhar do centro para os
detalhes, acaba se perdendo nas práticas religiosas, sem qualquer
significado eterno. A grande ameaça que assalta constantemente o
programa da igreja é a concepção de atividades irrelevantes, que
simplesmente mantém as pessoas entretidas. Tanto o passado decrépito
como o presente alucinado por novidades, carece de análise.
A igreja necessita de
uma avaliação contínua do seu programa de atividades sob os
cuidados do modelo da cruz. Somente contemplando Cristo crucificado
podemos focalizar o passado de modo acentuadamente significativo. Não
é possível ser tolerante com as vulgaridades religiosas, quando
vemos o panorama espiritual sob o prisma do Calvário. Também não é
possível ver o futuro sem a perspectiva da ressurreição. A igreja
de Cristo tem uma escatologia de esperança e conseqüentemente um
culto com elementos de expressão eterna. Na igreja não há lugar
para os métodos espetaculosos de passatempo religioso.
Os dois problemas mais
sérios que temos com o passado são: primeiramente, a lembrança
ardida de uma consciência culpada. Há uma multidão que sofre com a
dificuldade em crer no perdão consumado. Como o predador que enterra
a sua presa, comumente retornamos ao nosso passado para cavoucar a
carniça escondida. A falta de uma visão clara do sacrifício de
Cristo faz muita gente prisioneira de uma memória delituosa. Parece
que nunca podemos viver isentos da culpa, e precisamos recordar em
penitência a cena do crime.
Creio que a falta de
revelação da obra plena de Cristo crucificado é responsável por
este retorno mórbido ao passado delinqüente. Refém de
incredulidade, o acusado inflexível regressa sempre ao seu passado
para curtir sua expiação recorrente. Ele precisa se martirizar
neste ciclo de autopunição, a fim de liberar um sentimento crônico
de clemência. Vítima de uma teologia psicológica, onde a
autocomiseração é mais acentuada do que a fé, o pobre réu do
passado atura, sob pressão, uma mentalidade de desagravo constante.
Diz uma tradição, que Pôncio Pilatos viveu os seus últimos anos
exilado numa ilha, lavando as suas mãos. Nada pode ser mais terrível
do que uma consciência encarcerada num passado de amarguras, em
conseqüência de incriminações repetitivas.
Em segundo lugar, o
perigo do passado fica por conta da reedição dos modelos arcaicos e
irrelevantes que são eternizados nas tradições tolas. A falta de
uma visão clara da dimensão escatológica e da evolução
progressiva da igreja faz os saudosistas torcerem o pescoço para
contemplar um passado que já expirou. Muita gente destituída da
esperança da ressurreição, ainda pretende retornar ao velho modelo
judaico, que ficou completamente ultrapassado. Vemos atualmente uma
regressão acentuada no culto cristão, com a preocupação em
restaurar as formalidades festivas do judaísmo e estabelecer uma
liturgia atrelada às sombras que já foram superadas. Ninguém,
pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou
lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas
que haviam de vir; porém o corpo é de Cristo. Colossenses 2:16-17.
Depois da realidade de Cristo crucificado e ressurreto temos que
formular a nossa teologia com base na libertação deste passado
refugado, e na certeza plena da esperança vindoura.
A igreja cristã
precisa ter uma boa memória, recordando sempre os fundamentos
essenciais de sua crença. A fé tem história, mas não se atém
construindo um memorial daquilo que foi provisório. O padrão do
evangelho é a novidade de vida numa estrutura sempre inovadora. Um
legado da reforma protestante foi que a igreja reformada devia estar
sempre se reformando à luz da esperança escatológica.
O cristianismo não tem
lugar para o velhusco e bolorento sistema já deteriorado. O Senhor
Jesus foi bem categórico em sua avaliação. Ninguém costura
remendo de pano novo em veste velha; porque o remendo novo tira parte
da veste velha, e fica maior a rotura. Ninguém põe vinho novo em
odres velhos; do contrário, o vinho romperá os odres, e tanto se
perde o vinho como os odres. Mas põe-se vinho novo em odres novos.
Marcos 2:21-22. A mentalidade do evangelho é nova e a
estrutura da igreja tem que ser sempre renovada. Repetir os velhos
chavões ou cantar os cânticos da antiga comunidade judaica é olhar
para trás. É bom lembrar que a fé cristã nasceu de uma sepultura
aberta na madrugada do primeiro dia da semana. Ela é viva, alegre,
original e cheia de esperança, olhando firmemente para o alvo,
Cristo, seu autor e consumador.
Outro lhe disse:
Seguir-te-ei, Senhor; mas deixa-me primeiro despedir-me dos de casa.
Mas Jesus lhe replicou: Ninguém que, tendo posto a mão no arado,
olha para trás, é apto para o reino de Deus. Lucas 9:61-62.
O Perigo do
Passado
A experiência tem
história, mas não podemos viver voltados para o passado. Nenhuma
pessoa lúcida nega a importância da experiência na história. Sem
os fundamentos do passado não temos a competência para construir
com sabedoria o futuro. Os alicerces do amanhã estão baseados no
ontem. Precisamos do conhecimento antigo para elaborar o novo, pois
as raízes da antiguidade servem para sustentar o desenvolvimento
vindouro. O retrovisor é fundamental para o desempenho no tráfego.
Muitos desastres são resultados da falta da visão anterior. Porém,
a vida não pode andar para trás.
No caso em foco, Jesus
censura uma pessoa que estava presa ao cordão emocional de sua
linhagem. Ele queria seguir a Jesus, mas tinha um vínculo com a
família que precisava de acertos. Na vereda da fé cristã há
muitos que pensam deste modo. As tradições culturais e o peso da
opinião doméstica exercem grande pressão na decisão pessoal.
Muitos ficam amarrados ao julgamento do seu clã e sentem
dificuldades para tomar posição. São pessoas carentes que temem
perder o apoio emocional da família e buscam conciliar sua fé com a
aprovação dos mais chegados.
Porém, esta abordagem
ganha uma estimativa muito mais ampla, quando examinamos outros lados
da questão. O olhar para trás pode representar toda tentativa de
congelamento da experiência. Um grande risco que vemos na história
da igreja é o fascínio com o passado. Temos uma tendência de
perpetuar os métodos de uma época. Aquilo que foi de grande valor
num momento histórico recebe dimensões permanentes e, com isto, a
igreja se inclina para colecionar peças de museu.
Volto a insistir: não
é possível caminhar com saúde relacional, sem memória. O passado
tem importância fundamental no progresso de qualquer sistema, e há
elementos no projeto da igreja que são imutáveis. Faltando no
horizonte do tempo a dimensão do passado, fica muito difícil
construir uma visão adequada do futuro. Contudo, não é normal
permanecer com aquilo que ficou obsoleto. A lamparina ainda tem a sua
noite de glória nos lugares onde não há energia elétrica, mas
nenhum citadino defende a sua permanência no mundo de hoje. Andar de
charrete pode ser pitoresco, mas é atraso no mundo automotivo.
Antes de qualquer coisa
precisamos fazer uma distinção entre aquilo que é estável e as
coisas que são transitórias. Sabemos que a Palavra de Deus é
eterna e que os seus ensinamentos são duráveis. A ética da Bíblia
não muda. As leis do decálogo continuam vivas sob o comando da
graça. Ninguém pode considerar superados os princípios da moral
bíblica, uma vez que estão alicerçados na base perene do caráter
de Deus. Mas os costumes e os métodos históricos precisam ser
avaliados em cada geração. Não devemos mumificar aquilo que é
provisório. A permanência das coisas interinas representa um
desperdício de tempo e um gasto tremendo de energia.
A mulher de Ló
tornou-se uma estátua de sal ao virar-se para trás. A igreja
nostálgica perde sua função de sal da terra, quando se agarra a
uma metodologia retrógrada. A esterilidade de ambas se manifesta com
a contemplação do passado em desuso. Fixar os olhos naquilo que
pôde ser relevante noutra época, mas se tornou banal para este
tempo, se constitui na maior improdutividade na vivência
comunitária. As pessoas orientadas de forma dogmática para os
conceitos atrasados, tentando soluções antiquadas para problemas
novos, acabam se tornando desqualificadas para o seu momento
histórico. Por isso, é importante a distinção entre os fatos
eternos e as coisas efêmeras, a fim de não descartar o que é
imutável e não perpetuar aquilo que é temporário.
O apóstolo Paulo foi
um homem de vanguarda que sabia discernir entre os eventos
importantes e necessários e aqueles que serviam momentaneamente para
algum propósito. Os lances que foram admiráveis para ele numa
época, deixaram de merecer sua apreciação, quando auferiu os
melhores conceitos da graça de Deus. Irmãos, quanto a mim,
não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me
das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de
mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação
de Deus em Cristo Jesus. Filipenses 3:13-14. Paulo não ficou
paralisado em sua experiência passada, uma vez que sua meta tinha
proporções absolutas.
Não podemos perder de
vista o alvo. A fé cristã tem mira. A falta de um objetivo supremo
desencadeia o envolvimento com as coisas periféricas. Precisamos
atirar na mosca. Quando a igreja desloca seu olhar do centro para os
detalhes, acaba se perdendo nas práticas religiosas, sem qualquer
significado eterno. A grande ameaça que assalta constantemente o
programa da igreja é a concepção de atividades irrelevantes, que
simplesmente mantém as pessoas entretidas. Tanto o passado decrépito
como o presente alucinado por novidades, carece de análise.
A igreja necessita de
uma avaliação contínua do seu programa de atividades sob os
cuidados do modelo da cruz. Somente contemplando Cristo crucificado
podemos focalizar o passado de modo acentuadamente significativo. Não
é possível ser tolerante com as vulgaridades religiosas, quando
vemos o panorama espiritual sob o prisma do Calvário. Também não é
possível ver o futuro sem a perspectiva da ressurreição. A igreja
de Cristo tem uma escatologia de esperança e conseqüentemente um
culto com elementos de expressão eterna. Na igreja não há lugar
para os métodos espetaculosos de passatempo religioso.
Os dois problemas mais
sérios que temos com o passado são: primeiramente, a lembrança
ardida de uma consciência culpada. Há uma multidão que sofre com a
dificuldade em crer no perdão consumado. Como o predador que enterra
a sua presa, comumente retornamos ao nosso passado para cavoucar a
carniça escondida. A falta de uma visão clara do sacrifício de
Cristo faz muita gente prisioneira de uma memória delituosa. Parece
que nunca podemos viver isentos da culpa, e precisamos recordar em
penitência a cena do crime.
Creio que a falta de
revelação da obra plena de Cristo crucificado é responsável por
este retorno mórbido ao passado delinqüente. Refém de
incredulidade, o acusado inflexível regressa sempre ao seu passado
para curtir sua expiação recorrente. Ele precisa se martirizar
neste ciclo de autopunição, a fim de liberar um sentimento crônico
de clemência. Vítima de uma teologia psicológica, onde a
autocomiseração é mais acentuada do que a fé, o pobre réu do
passado atura, sob pressão, uma mentalidade de desagravo constante.
Diz uma tradição, que Pôncio Pilatos viveu os seus últimos anos
exilado numa ilha, lavando as suas mãos. Nada pode ser mais terrível
do que uma consciência encarcerada num passado de amarguras, em
conseqüência de incriminações repetitivas.
Em segundo lugar, o
perigo do passado fica por conta da reedição dos modelos arcaicos e
irrelevantes que são eternizados nas tradições tolas. A falta de
uma visão clara da dimensão escatológica e da evolução
progressiva da igreja faz os saudosistas torcerem o pescoço para
contemplar um passado que já expirou. Muita gente destituída da
esperança da ressurreição, ainda pretende retornar ao velho modelo
judaico, que ficou completamente ultrapassado. Vemos atualmente uma
regressão acentuada no culto cristão, com a preocupação em
restaurar as formalidades festivas do judaísmo e estabelecer uma
liturgia atrelada às sombras que já foram superadas. Ninguém,
pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou
lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas
que haviam de vir; porém o corpo é de Cristo. Colossenses 2:16-17.
Depois da realidade de Cristo crucificado e ressurreto temos que
formular a nossa teologia com base na libertação deste passado
refugado, e na certeza plena da esperança vindoura.
A igreja cristã
precisa ter uma boa memória, recordando sempre os fundamentos
essenciais de sua crença. A fé tem história, mas não se atém
construindo um memorial daquilo que foi provisório. O padrão do
evangelho é a novidade de vida numa estrutura sempre inovadora. Um
legado da reforma protestante foi que a igreja reformada devia estar
sempre se reformando à luz da esperança escatológica.
O cristianismo não tem
lugar para o velhusco e bolorento sistema já deteriorado. O Senhor
Jesus foi bem categórico em sua avaliação. Ninguém costura
remendo de pano novo em veste velha; porque o remendo novo tira parte
da veste velha, e fica maior a rotura. Ninguém põe vinho novo em
odres velhos; do contrário, o vinho romperá os odres, e tanto se
perde o vinho como os odres. Mas põe-se vinho novo em odres novos.
Marcos 2:21-22. A mentalidade do evangelho é nova e a
estrutura da igreja tem que ser sempre renovada. Repetir os velhos
chavões ou cantar os cânticos da antiga comunidade judaica é olhar
para trás. É bom lembrar que a fé cristã nasceu de uma sepultura
aberta na madrugada do primeiro dia da semana. Ela é viva, alegre,
original e cheia de esperança, olhando firmemente para o alvo,
Cristo, seu autor e consumador.